quarta-feira, 20 de março de 2013

"Um pouquinho só da infância"

Ah! Quando nasci? Nasci no dia do Fico, sabe que data é essa? Não! Não se estuda mais história como antigamente! Ahahahah, ainda bem. É no dia nove de janeiro. D. Pedro I, quando decidiu desobedecer ao governador de Lisboa e permanecer no Brasil, em 1822, disse “Se é para o bem geral da nação, diga ao povo que fico.” E o pior é que ficou para o nosso bem ou não. E estamos aqui colhendo os belos frutos dessa ficada até hoje.

Eu tenho um olho maior que o mundo, por isso fui uma menina peralta. Vi o mundo além do infinito. Busquei o término do mundo além das montanhas, encontrei outras montanhas além das montanhas, descobri que o mundo não tinha fim. Eu era um cisquinho, nada mais que um cisco de gente começando a enxergar o mundo além do horizonte. Já era filosofia. As divagações faziam parte da minha alma.

Por outro lado, comecei a questionar Deus. Se Deus criou o mundo em sete dias, e tudo que nele existe. Quem criou Deus? Fiquei muito encasquetada com tudo isso. E depois cheguei à conclusão que Deus a gente aceita, não questiona, a gente sente na palavra, no aperto de mão, no carinho, na compreensão... Ele existe dentro de cada ser. Transferimos Deus ao outro em todos os momentos. Deus está na natureza, nos animais com os quais aprendemos muito, no rio que corre e sabe onde quer desaguar, no meu coração e no seu coração e no meu olhar e no seu olhar.

Vivi minha infância. Atravessei a cerca do vizinho, junto com minhas primas e irmãs, entrei no pomar para apanhar jabuticabas. O vizinho era um cão farejador.

Um dia atravessamos a cerca e subimos nos pés de jabuticabas. Eram vários pés, todos plantados na mesma época, porque eram do mesmo tamanho. Você sabia que um pé de jabuticada plantado naturalmente leva vinte anos mais ou menos para começar a produzir frutos. E levamos um segundo para matar a árvore.

As meninas, que eram minhas irmãs e primas, foram embora porque já tinham se empanturrado de jabuticabas, como eu era a mais velha, e o olho era maior que o meu estômago, fiquei sobre um dos galhos da jabuticabeira. Meu Deus, pra quê? Lá em cima, bem na pontinha do galho, graças a Deus as jabuticabeiras têm os galhos resistentes, percebia a aproximação lenta daquele velhinho, alto, magro e bravo. Era o senhor Altino, tio do dono das terras. Morria de medo! Ficava como um mico agarradinha no galho sem me mexer. Acho que ele era meio surdo, meio cego e não tinha olfato, porque crianças têm cheiro e ele nada sentia, percebia e ouvia. Quando ia se afastando, que alívio! Eu continuava chupando aquelas doces jabuticabas pretinhas, pretinhas. Que delícia! Hum! Eram sabarás as doces jabuticabas.





Por Eliana Prata - Coordenadora do Ensino Fundamental 1 CNSD
[Este trecho faz parte de um livro que ela está escrevendo]

Um comentário:

  1. Nossa!! Assim você deixa a gente com vontade... Acaba logo este livro, vai ser muito gostoso, igual o sabor destas jaboticabas!!

    Vai ser lindo!! Corre, corre.. acaba logo!!

    Estou aqui esperando!!

    Beijão sua linda!!

    ResponderExcluir